envelhecida

Já sei as cores que gosto.

E o corte de cabelo que me cai bem.

Já tenho as jóias certas: dois anéis de Kamacita, dois brincos de prata para cada orelha e um relógio do Paraguai.

Já sei que sou das pequenezas e não da grande escala.

Já notei como posso e como devo me portar diante de algumas pessoas e que devo esperar um tempo antes de dizer se tenho ou não afinidades. E se não tiver, saber que em algum ponto sempre se tem mas que não preciso inventar sentimentos.

Já observei que me dou muito bem com as mães das minhas amigas e isso me torna política, ou velha. 

Já observei meus defeitos e notei as minhas qualidades, mas confesso que nunca foi o bastante para nenhuma das duas contradições. Sempre vão precisar de uma grande pesquisa.

Já esclareci que existe um Deus dentro de mim e para mim e que ele é maravilhoso. E o quanto é bom não sentir desemparada diante da vida. 

Já tenho meus Santos separados: Nossa Senhora e São Francisco.

Já tracei o melhor escritor do manual de instruções para sobrevivência: Jesus.

Já notei que preciso ser nômade, mas que também preciso ter filhos.

Já percebi que para traçar um grande caminho, só preciso de disciplina e paciência. Não de grandes aquisições materiais ou intelectuais. O importante é se saberei dar nome aos bois.

Já notei que é preciso ter convicções fixas mesmo que seja durante um dia.

Já percebi os aspectos invisíveis e o quanto eles nos dizem.

Já notei que meu mundinho interior é cômodo e cor de rosa e que o mundão lá de fora tem todas as cores.

Já percebi o quanto alguns homens são cafajestes e o quanto outros são humanos.

Já percebi também que estamos de passagem e isso torna todos os detalhes mais bonitos.

Laís de Andrade